17 de fevereiro de 2009

Situações de desenvolvimento profissional



Temos um desafio muito grande: formar formadores competentes capazes de identificar e valorizar os saberes que seus professores possuem e não somente sujeitos capazes de transmitir conhecimento, repassar saberes. Desafio de formar sujeitos que sejam capazes de ler a necessidade de seu grupo, de selecionar material adequado para buscar a solução de problemas que deverão enfrentar e não apenas sujeitos capazes de reproduzir as atividades propostas no material do programa. Desafio de formar pessoas críticas, capazes de ler nas entrelinhas e de assumir uma posição própria, que interajam, ao invés de persistir em formar indivíduos dependentes de regras, normas, cartilhas.
O desafio é formar pessoas desejosas de penetrar no mundo da educação, dispostas a identificar-se com o parecido ou solidarizar-se com o diferente. Assumir este desafio significa abandonar as atividades mecânicas e posicionar-se como parceiro, co-produtor.


Enfrentar este desafio implica uma mudança profunda, e levá-lo à prática não será tarefa fácil.


Luciana Hubner



O desenvolvimento de competências de formador de professores e de uma cultura profissional própria depende de um processo de formação continuada dos educadores, que passam a assumir essa função. Todo profissional que assume novas tarefas tem o direito e o dever de preparar-se para desempenhá-las. Como em geral não contamos no país com cursos de formação inicial de formadores, as competências de formador, na maior parte dos casos, serão desenvolvidas em serviço, ou seja, com os profissionais no exercício da função.
Essa circunstância fortalece o direito de esses profissionais contarem com condições institucionais para se qualificarem adequadamente, o Situações de desenvolvimento profissional que depende, entre outros aspectos, da existência de um grupo de interlocução que tome a reflexão sobre a prática de formador, o estudo e a documentação do trabalho como as principais estratégias de formação.
Tomando como bandeira o trabalho coletivo, disse o educador russo Anton Makarenko:"Não imaginei nem imagino como se poderia educar um coletivo, pelo menos um coletivo infantil, se não houver um coletivo de educadores. Não há dúvidas de que não se poderá fazê-lo se cada um dos educadores de uma escola realiza, separadamente,o seu trabalho educativo, segundo seu próprio entendimento e desejo."
Pois podemos perfeitamente transpor esse pressuposto para a condição de formador, parafraseando-o:
"Não imaginamos – nem poderíamos imaginar – como formar adequadamente um coletivo, pelo menos um coletivo de educadores, se não houver um coletivo de formadores. Não há dúvidas de que não se poderá fazê-lo se cada um dos formadores de uma instituição realiza, individualmente, o seu trabalho segundo seu próprio entendimento e desejo, baseado apenas em recursos pessoais para realizá-lo."
A construção de competências de formador depende de duas condições fundamentais: a possibilidade de refletir sobre a prática e de ampliar o universo de conhecimentos. Essas questões passam a ser abordadas a seguir.




A reflexão sobre as nossas experiências acalma as inseguranças. Nos fortalece diante delas.


Renata Violante




No Capítulo 1, esse importante procedimento do qual depende, emgrande medida, a construção de competências profissionais, é tratadocomo uma ação cognitiva do professor (que não é diferente para oformador) e como eixo metodológico do processo de formação.Na verdade, falar a respeito da importância da reflexão sobre a prática,especialmente num material como este, é uma redundância: este livro éfruto de reflexão sobre a prática. Igual redundância é falar da importânciada reflexão por escrito: se esse não fosse um procedimento dos formadoresque contribuíram com a elaboração deste livro, ele tenderia a serum tratado teórico sem muita vida. Mas, ao contrário, aqui se tem asocialização do conhecimento experiencial de um conjunto enormede educadores que assumiram a tarefa de formar outros educadores.




Todo educador pensa sobre sua prática o tempo todo: durante as situaçõesde trabalho, lidando com os imprevistos e buscando soluções coerentescom sua concepção e fora das situações de trabalho, quando faz de suaprática um objeto de análise e reflexão. O teórico Donald Schön defineem seus estudos estes dois movimentos: o conhecimento na ação (que é postoem uso enquanto atua) e o conhecimento sobre a ação (que é fruto de uma reflexãoposterior, distanciada da ação).


Beatriz Bontempi Gouveia



O conhecimento construído/reconstruído no exercício da profissão, quando socializado, é, ao mesmo tempo, produto da reflexão sobre a prática e desencadeador de outras/novas reflexões sobre a prática. É conhecimento sobre a ação. O empenho em falar e escrever sobre ele, para torná-lo acessível aos pares, revela, por parte do educador, uma atitude de generosidade e compromisso com o outro e consigo mesmo. Com o outro porque contribui com a qualidade da sua atuação. E consigo mesmo porque permite dar a conhecer os saberes, as opiniões, as dúvidas, as inquietações profissionais e o próprio processo de aprendizagem.

Os espaços e as possibilidades de reflexão sobre a prática de formador são abordados a seguir, especialmente na forma de depoimentos dos educadores que se dispuseram a relatar suas experiências e compartilhar seus saberes experienciais. Os itens em torno dos quais esses depoimentos se articulam são os seguintes:
• o grupo como espaço de aprendizagem e de reflexão coletiva;
• o apoio dos parceiros;
• a observação do outro em atividade:
- estágio
- análise de situações documentadas em vídeo
• o planejamento conjunto do trabalho;
• a realização do trabalho em parceria;
• a reflexão por escrito;
• a correspondência:
- comunicação pela Internet.
A experiência tem mostrado – e todos os relatos dos formadores confirmam – que o desenvolvimento das competências profissionais de um educador passa necessariamente pela interação com o outro. É certo que a reflexão sobre a prática e a ampliação do universo de conhecimentos (condições para a construção e ampliação das competências) dependem do empenho pessoal de cada um, mas é igualmente certo que o intercâmbio com os pares é o maior aliado nesse sentido.



Por mais competentes que sejamos, o que mais enriquece um educador é a possibilidade de estudar, planejar e coordenar um trabalho em parceria. Não há nada mais gratificante do que a solidariedade e a cooperação, tanto no nível pessoal como profissional. Rosa Maria Antunes de Barros



O grupo como espaço de aprendizagem e reflexão coletiva



Qualquer grupo de profissionais que tenha uma finalidade formativa, de fato representa um espaço de convívio com a diversidade, o que em geral é muito produtivo para o desenvolvimento pessoal de cada um de seus participantes: diversidade de informações, de representações, de interpretações, de opiniões, de propostas, de possibilidades. Esse é um contexto favorável de aprendizagem, pois permite a ampliação do repertório de saberes, a reflexão sobre o próprio conhecimento, a transformação dos níveis de compreensão, o desenvolvimento de flexibilidade das formas de pensar,o uso de recursos cada vez mais complexos de análise, a ampliação da capacidade de convívio com a diferença e aceitação da diversidade.

É possível que os participantes de um grupo formem-se mutuamente, mesmo que nenhum deles desempenhe o papel de formador dos demais. "Basta que se envolvam em uma tarefa cooperativa que provoque conflitos e favoreça a evolução das representações,dos conhecimentos,dos métodos de cada um,por meio do confronto com outras maneiras de ver e de agir. O confronto dos pontos de vista estimula uma atividade ‘metacognitiva’ da qual todos extraem um benefício […]" (Perrenoud, 2000)
No entanto, é necessário que a tarefa a que o grupo se dedica "imponha" a necessidade de uma verdadeira cooperação, isto é, funcione como um dispositivo que obrigue o grupo a trabalhar cooperativamente – uma tarefa que, para ser realizada, dependa, de fato, da participação e da complementaridade da ação de todos os envolvidos.
O desenvolvimento de uma cultura de cooperação, de aprendizagem em parceria e de trabalho coletivo é necessário em qualquer grupo que se pretende formativo, pois disso depende o fortalecimento de relações de solidariedade, respeito mútuo, tolerância e aceitação da diversidade – uma exigência do convívio social e da formação de educador e uma condição para o crescimento pessoal. Além do que, um grupo cooperativo é também um contexto de aprendizagem porque favorece a exposição dos próprios conhecimentos, concepções, opiniões e idéias: como sabemos um dos obstáculos à aprendizagem é o não-reconhecimento, pelo indivíduo, da sua capacidade pessoal e do valor de seus conhecimentos e experiências.


"Quando os professores trabalham em equipe, tornam-se capazes dedesenvolver essas atitudes e essa cultura ao longo de toda a formação"(Perrenoud, 2000). Trabalhar em equipe pressupõe determinadascompetências e a convicção de que a cooperação é um valor profissional. 13




Uma das metas da nossa proposta na Secretaria de Educação é instituir umtrabalho de formação continuada nas escolas. Para isso, buscamos resgataro papel de formador do coordenador da escola, que historicamente vemsendo confundido com outras ações, desde as mais burocráticas até as maisbanais. Percebemos que, embora a maioria gostasse da idéia, ainda era muitodifícil se colocar como formador e arcar com todas as responsabilidades quea função impõe. Uma das ações que percebo como fundamental para esteprocesso de construção do papel de formador é estabelecer um trabalhode formação continuada também para os coordenadores, com encontrossemanais, onde além de seu papel, todas as ações que decorrem dele sãotematizadas e discutidas coletivamente. Rosa Maria Monsanto Glória





O apoio dos parceiros


A iniciação de todo indivíduo na profissão ou em novas funções, que passa a assumir ao longo de sua trajetória profissional,não precisa ser um processo doloroso, como muitas vezes ocorre no campo da educação. Com o apoio de colegas que desempenham o papel de parceiros experientes ou simplesmente de interlocutores, é possível assumir as tarefas que se colocam de forma "assistida", o que contribui para a segurança pessoal e, certamente, para melhores resultados no trabalho.
O que se pode verificar nos relatos que compõem este livro é que é possível criar uma cultura de parceria e solidariedade entre os profissionais que exercem as mesmas funções – no caso, os formadores de professores – e que é importante difundi-la como uma conquista e um valor que precisam ser preservados.


Atualmente, quando inicio o trabalho nos grupos, tenho lido trechos da Odisséia, focando a narrativa dos acontecimentos que antecederam a volta de Ulisses, vitorioso na batalha de Tróia, rumo a Ítaca, local em que era rei. Sem saber dos perigos e aventuras que o aguardavam até sua chegada. Porque todo grupo é para mim uma deliciosa aventura, que carrega medos e coragens – e neste percurso, nossos parceiros mais experientes são de grande valia. No início do meu trabalho de formadora, Rosana assumiu comigo esse papel, à medida que exercitou a sua escuta atenta e acolhedora, compartilhou hipóteses, evidenciou dúvidas e "certezas" que permeiam todo processo de formação, forneceu indicação bibliográfica para aprofundamento dos meus estudos.
Penso que o bom formador é aquele que acolhe o grupo, a idealização deste, e consegue desmistificar e apontar caminhos para o exercício da autonomia profissional. Foi crucial na minha atuação ter a oportunidade de iniciar minha trajetória no Programa, tendo como referência esse modelo adequado, que motivou a ousadia. Rosa Silvia Lopes Chaves



Quando preciso faltar às reuniões dos formadores – pois como sou também professora, isso às vezes acontece – sei o quanto estou perdendo. E lamento muito. Além do intercâmbio produtivo que sempre ocorre nessas reuniões, geralmente a partir das experiências relatadas, se discutem formas alternativas de abordar determinados conteúdos, o que é uma contribuição fundamental para todo formador.


Rosalinda S. Ribeiro de Vasconcelos



Com o grupo grande, a leitura do texto levou muito tempo, e eu estava ansiosa em como administrá-lo, sendo este o primeiro dia de atividades. As leituras trouxeram histórias ternas, algumas engraçadas, mas, na sua maioria, traziam desrespeito, humilhação, autoritarismo, desvalorização e a mais marcante falava de abuso sexual de um professor em plena sala de aula, o que deixou todos chocados. Como primeira reação nervosa, o grupo Formadora discute com futuros formadores aplaudiu e em seguida silenciou.

Optei por não fazer comentários, pois o fato de a professora ler o seu textocom tanta clareza e firmeza, no sentido de denúncia, demonstrava que jáconseguia lidar com a emoção que a situação lhe provocava.No final das leituras, a Neide Nogueira, coordenadora geral do Encontro,presente naquele momento, manifestou-se em relação ao depoimento,traduzindo o que, no fundo, todos nós queríamos dizer a ela e não sabíamos como. Jane Padula




A supervisão, por um parceiro experiente, das ações desenvolvidas pelosparticipantes de um grupo não pode ser confundida com a avaliação dos seussaberes técnicos ou dos seus talentos. A reflexão que tem lugar numa situaçãocomo essa não é um julgamento, mas a possibilidade de pensar de forma críticae mais consistente sobre as ações práticas e as intenções educativas que se tem.A supervisão é uma ação formativa muito eficiente, primeiro porque qualquersujeito aprendiz necessita de apoio e acompanhamento em seu percurso deapropriação de novos conhecimentos, segundo porque é um recurso valiosopara monitorar o percurso de cada educador a seu tempo, atendendoa necessidades pessoais de aprendizagem.


Beatriz Bontempi Gouveia

A reunião que aqui vou relatar teve como objetivo discutir com coordenadoras de grupos de formação de professores formadores quais as dificuldades que estavam encontrando para o desenvolvimento do projeto Parâmetros em Ação e também as conquistas que têm alcançado.



Os depoimentos foram os seguintes:
• Falta de sensibilização do grupo: as pessoas não sabem o que estão fazendo lá.
• Foi difícil formar o grupo de formadores. Há uma deficiência na leitura.
Existe uma disponibilidade maior do grupo do interior (24 formadores são da capital e 18 são do interior).
• Há dificuldade em diagnosticar do que os professores formadores estão precisando mais (com relação aos conteúdos)
• Não sabe se o que falta é um pouco mais de compromisso, mas com certeza falta estudo. Algumas pessoas do grupo não se sentem seguras para trabalhar com formação de professores.
• Estamos conquistando o grupo. É necessário conquistar as pessoas, encontrar formas de trazê-las para trabalhar com empenho e dedicação.
• É necessário planejar e registrar o trabalho realizado pelos outros módulos para se ter um acompanhamento total do trabalho.
• Precisamos ter cuidado com o emprego de alguns termos: por exemplo, o grupo não tinha claro o que era intervenção pedagógica.
• Como estabelecer uma relação afetuosa com as pessoas de um grupo com quarenta? Quais as dinâmicas; quais os chamados?



Após as colocações, teci algumas considerações sobre o que foi dito, como contribuição:
• Antecipar as questões que o grupo possa vir a ter, para se promover uma intervenção consciente e não simplesmente ficar na posição de "bombeiro" ou "malabarista". Uma vez antecipadas as questões, é possível interferir com mais consistência já que a intervenção pode ser planejada previamente, evitando um tratamento mais improvisado das questões trazidas pelo grupo.
• Tratar as informações para o grupo de uma maneira diferenciada, procurando atender aos diferentes níveis de compreensão que as pessoas têm sobre o assunto que esteja sendo discutido.
• É essencial elaborar um planejamento para cada Encontro e também fazer um registro das metodologias que podem ser boas para o trabalho com todos os módulos, para que dessa forma se construa efetivamente um "projeto de formação".
• Prestar bastante atenção no que não deu certo, pois isso pode se tornar tema de discussão. Buscar as bases teóricas para se entender por que determinadas estratégias não funcionaram.
• Para que o Programa seja bem-sucedido, é importante que haja uma relação afetiva estável dentro do grupo (o que parece já estar ocorrendo) e que se desenvolvam posturas de estudo (como leitores críticos). Essas posturas de vem estar presentes no trabalho com todos os módulos.
Essas considerações geraram boas discussões com o grupo de coordenadoras. Elas consideraram contribuições pertinentes para o momento que estavam vivendo, para instrumentalizá-las no planejamento dos próximos Encontros, assim como para a formação do próprio grupo – tanto no que se refere à construção de uma linguagem comum, que passa necessariamente pela discussão das concepções que cada uma tem dos conteúdos dos módulos, como do significado do trabalho de formação dos professores formadores e dos professores que estão em sala de aula.
Para concluir, abordei a importância do trabalho de formação ser intencionalmente organizado como um projeto coletivo, em oposição às inconseqüentes ações improvisadas. O projeto deve ser visto como um conjunto de princípios para orientar as ações e a tomada de decisões e para organizar a história do grupo – sabendo que, para "oxigenar" esse projeto é imprescindível a reflexão do formador, tanto em grupo como individual. Rosana Dutoit
Aos formadores que desenvolvem assessoria e apoio metodológico ao trabalho de coordenadores de grupo e professores, cabe acompanhar o andamento dos grupos, trazer experiências significativas desenvolvidas
em outros lugares, favorecer o contato entre educadores de diferentes grupos e escolas, além de ações como as seguintes:
• discussão do planejamento e realização de atividades;
• contribuição à identificação de problemas e à antecipação de soluções;
• proposição de medidas e estímulo para o adequado desenvolvimento dos trabalhos;
• discussão de formas de gestão de conflitos e de soluções de consenso;
• reflexão sobre o percurso de aprendizagem do grupo, tendo como base os registros que documentam o processo de discussão, as sínteses conclusivas, as propostas etc.;
• orientação e acompanhamento da análise das produções do grupo;
• incentivo à publicação e à socialização das produções do grupo;
• estímulo à circulação de informação e à comunicação entre educadores de diferentes lugares, seja por contato direto ou por meio de recursos de comunicação a distância. Walter Takemoto



A observação do outro em atividade



Por certo, a simples observação da conduta do outro não nos ensina tudo o que é necessário para procedermos adequadamente como formadores. Afinal, competências profissionais não se constroem por imitação. Mas quando o profissional tem sua própria experiência e busca na conduta do outro elementos para aprender a atuar cada vez melhor e a refletir sobre a prática de formador, então a observação pode contribuir bastante para a sua aprendizagem e para a ampliação do repertório de procedimentos adequados ao trabalho. Como se sabe, os procedimentos são conteúdos aprendidos principalmente na prática: é ao fazer que aprendemos como fazer. Nesse processo, o papel do parceiro experiente é determinante para o domínio de procedimentos, por três razões principais: porque pode explicar detalhadamente o que deve ser feito com antecedência, porque pode servir de modelo de referência para o aprendiz e porque pode refletir com ele o que foi feito.
O trabalho de formação em parceria é muito interessante, pois favorece a análise das ações desenvolvidas a partir do ponto de vista de um outro formador.
Esse trecho de relatório refere-se ao trabalho desenvolvido com os coordenadores de grupo, em parceria com Laura, formadora de Artes Visuais do Grupo da Educação Infantil.
Enquanto Laura desenvolvia o módulo, preocupei-me em anotar os procedimentos metodológicos que ela estava utilizando, para que pudesse evidenciá-los para o grupo, focalizando a importância de cada um deles.
Além disso, procurei intervir quando a informação parecia não ter ficado clara para os participantes do grupo ou quando julgava insuficiente alguma explicação. Para realizarmos essa parceria, fizemos um planejamento e combinamos o papel de cada uma durante o trabalho, com a intenção de evitar atropelos e desencontros. Ao final de cada dia de atividade, avaliávamos nossa atuação e replanejávamos o encontro seguinte.
Na nossa divisão de tarefas, Laura ficou responsável pelo tratamento do conteúdo do eixo curricular Artes Visuais, e eu pela observação da forma como ela os desenvolveria, ou seja, atenta em anotar e analisar as estratégias utilizadas para a formação dos coordenadores, para que, ao finalizar cada dia de trabalho pudesse discuti-las, explicitando as concepções que as sustentam.
Com relação aos procedimentos metodológicos pontuei alguns, que foram os seguintes:
1. A organização do espaço físico (na ocasião, foi feita a proposta de expor os trabalhos realizados, organizando-se uma exposição e também a bibliografia indicada).
Ressaltei para o grupo a importância de se organizar um espaço favorável à aprendizagem, seja ele destinado à formação dos professores ou dos alunos na sala de aula e/ou escola.
"Nos processos de ensino e de aprendizagem, o espaço físico disposto pelo educador possui duas funções. Proporciona o lugar para a aprendizagem e, ao mesmo tempo, atua como participante no ensino e na aprendizagem."
Há, portanto, uma relação direta entre organização do espaço físico, aprendizagem e construção de condutas por parte do professor/aluno.
2. Situar os objetivos do Programa Parâmetros em Ação.
Observei que essa informação é importante porque localiza a amplitude do projeto e contextualiza a ação tanto dos participantes do grupo como dos formadores.
3. Apresentação dos objetivos do trabalho.
Essa apresentação é necessária porque se compartilha com os coordenadores de grupo o que vai acontecer no dia de trabalho, além de favorecer que o grupo se comprometa, por meio de posturas e engajamento pertinentes, com o alcance dos objetivos propostos.
4. Expectativa de aprendizagem. Explicita o que se espera que aprendam e desenvolvam com o trabalho.
5. Leitura do Referencial Curricular Nacional para a Educação Infantil.
Marca esse material como referência para estudos e discussões.
6. Estratégias metodológicas utilizadas no encontro:
Fazer (produção artística)/Ler/Discutir/Organizar informações/Registrar.
É importante considerar que para diferentes conteúdos utilizamos diferentes estratégias. A eleição de uma ou de outra depende do objetivo que se pretende alcançar e da natureza do conteúdo trabalhado.
Finalizei com a exposição de alguns itens, ainda referentes à formação de educadores. No trabalho de formação é preciso:
• considerar quais são os conhecimentos prévios dos educadores;
• identificar quais são os sujeitos que compõem o coletivo;
• potencializar os saberes individuais;
• discutir os pressupostos teóricos que determinam esses saberes;
• problematizar;
• buscar soluções coletivamente;
• utilizar o conhecimento teórico como fonte de informação para interpretar a prática;
• interpretar a prática e reorganizá-la;
• apropriar-se da prática e do processo de construção do projeto educacional – autoria;
• elaborar sínteses periódicas;
• promover a socialização das práticas individuais.
Além disso, foi fundamental evidenciar, para as coordenadoras de grupo, a interação que está na base do trabalho de formação e reafirmar que ela supõe conflitos, confrontos de pontos de vista, concepções etc., que devem ser previstos, na medida do possível. É preciso criar condições de emocionalidade, cujos vínculos sejam reais, entre coordenador e professores, gerando assim um
clima de segurança e confiança.
Outro aspecto que mereceu ser tratado foi a da parceria mais experiente. O coordenador do grupo, pela própria função que ocupa, é colocado no lugar de parceiro mais experiente, porém vale esclarecer que nem sempre isso é real.
A depender do assunto a ser tematizado, é importante reconhecer no grupo quem é o parceiro mais experiente, que poderá socializar suas experiências e seu entendimento sobre o conteúdo apresentado.
Cabe ainda ao coordenador de grupo refletir sobre a importância do comportamento ético, do respeito ao conhecimento do outro e do compromisso com o planejamento. Afinal, como coloca Makarenko: "Não podemos simplesmente educar um homem, não temos o direito de realizar um trabalho educacional, quando não temos frente aos olhos um objetivo político determinado. Um trabalho educativo que não persegue um meta detalhada, clara e conhecida em todos os seus aspectos, é um trabalho educativo apolítico." Rosana Dutoit



Certa ocasião, desenvolvi um trabalho com coordenadores de grupo do Parâmetros em Ação, em que parte da turma conhecia apenas os Módulos de 1ª a 4ª série e parte da turma apenas o Módulo de Alfabetização. Meu papel era ajudá-los a socializar para os outros o que já sabiam sobre os módulos e os demais desconheciam e aprofundar as discussões que se mostrassem necessárias para o grupo.




Foi uma experiência muito rica para eles e para mim, porque a minha tarefa era ajudá-los a preparar as atividades que desenvolveriam, eles próprios, com os demais e, dessa forma, pude avaliar o tempo todo como procediam no papel de formadores – e depois socializar com eles as minhas observações.A seguir, transcrevo algumas dessas observações:


1. Coordenação em dupla.O entendimento que tiveram é que duas pessoas deveriam realizar a atividade juntas, simultaneamente. Ficava difícil para os participantes do grupo centrar a atenção em um dos coordenadores, pois eles estavam em cena ao mesmo tempo. Discutimos, então, como deve ser a divisão de tarefas numa situação como essa e qual o papel do parceiro, quando o outro coordenador está encaminhando os trabalhos.


2. Equilíbrio entre o tratamento dos conteúdos e das estratégias metodológicas.Durante as atividades de simulação, os primeiros grupos estavam mais preocupados com o conteúdo – em demonstrar o que sabiam a respeito – do que com as estratégias metodológicas. Ao longo do trabalho, fomos conversando sobre o papel e o significado desses dois elementos, quando se está em um grupo de formadores. A discussão metodológica da formação, em geral, não faz sentido no trabalho com os professores, mas tem enorme importância no trabalho com os formadores, pois nesse caso as estratégias convertem-se também em conteúdo: com os professores, é preciso selecioná-las adequadamente e com os formadores é preciso também tematizá-las. Por isso, elas assumem característica de conteúdo.
3. Organização dos grupos para a realização das atividades.
Foi necessário discutir com eles a importância de conhecer o mais possível o que pensam os participantes do grupo, para que se possa levar suas questões em conta, no decorrer dos trabalhos (para tematizar isso, usei como referência a própria situação que estávamos vivendo).
Sugeri que escrevessem num cartaz as respostas de cada grupo dadas às questões propostas para discussão, uma vez que não havia lousa na sala (e a inexistência de registro dificultaria a reflexão após algum tempo).
E enfatizei o quanto era fundamental circular pela sala e acompanhar o trabalho dos subgrupos, o que favorece conhecer o que pensam as pessoas que nem sempre se colocam nas discussões do grupão.

4. Antecipação de respostas.
Mostrei que as discussões mais ricas foram aquelas em que os grupos se prepararam previamente, antecipando as respostas que poderiam ser dadas pelos colegas e/ou as questões que provavelmente colocariam.
Essa competência de antecipar possibilidades é fundamental para preparar boas intervenções – quanto mais conhecemos o sujeito da formação, mais se torna possível esse tipo de antecipação.
5. Uso dos vídeos.
Discutimos que:
• durante os Encontros, deveriam evitar ficar com o livro nas mãos, pois isso poderia dar a impressão de que estavam inseguros, precisando consultar a todo instante o que está indicado no módulo;
• seria bom explicitar para os professores o contexto em que os vídeos foram produzidos;
•é muito importante apresentar e trabalhar com os vídeos de uma forma sedutora e convidativa;
• as pausas e intervenções propostas no Módulo de Alfabetização são sugestões que podem sofrer alterações conforme a necessidade.

Foi uma experiência muito rica para eles e para mim, porque a minha tarefa era ajudá-los a preparar as atividades que desenvolveriam, eles próprios, com os demais e, dessa forma, pude avaliar o tempo todo como procediam no papel de formadores – e depois socializar com eles as minhas observações.
A seguir, transcrevo algumas dessas observações:
1. Coordenação em dupla.
O entendimento que tiveram é que duas pessoas deveriam realizar a atividade juntas, simultaneamente. Ficava difícil para os participantes do grupo centrar a atenção em um dos coordenadores, pois eles estavam em cena ao mesmo tempo. Discutimos, então, como deve ser a divisão de tarefas numa situação como essa e qual o papel do parceiro, quando o outro coordenador está encaminhando os trabalhos.
2. Equilíbrio entre o tratamento dos conteúdos e das estratégias metodológicas.
Durante as atividades de simulação, os primeiros grupos estavam mais preocupados com o conteúdo – em demonstrar o que sabiam a respeito – do que com as estratégias metodológicas. Ao longo do trabalho, fomos conversando sobre o papel e o significado desses dois elementos, quando se está em um grupo de formadores. A discussão metodológica da formação, em geral, não faz sentido no trabalho com os professores, mas tem enorme

Perguntas dos coordenadores para o grupo.
Sugeri que, sempre que possível, antecipassem as perguntas, pois, devido à ansiedade, colocavam as respostas nas próprias perguntas que faziam.
E fiz com que prestassem atenção no seguinte: quando ouviam a resposta do grupo, a pergunta seguinte do coordenador geralmente era "Todos concordam?". E, nesse momento, o silêncio era total. Propus que modificassem a pergunta para "O que vocês acham da resposta dada pela colega?" Isso favoreceu a discussão – parece ser a mesma coisa, mas é completamente diferente, como a prática confirmou.
Perguntas do grupo para os coordenadores
Havia uma ansiedade de o coordenador responder às perguntas. Sugeri que as devolvessem para os grupos, para que todos pudessem se comprometer com a busca de respostas. Isso também poderia ser uma estratégia para que eles mesmos tivessem mais tempo para elaborar a resposta de forma adequada.
Muitos dos aspectos que apontei para o grupo também foram aprendizados para mim e contribuíram para a reflexão sobre a minha própria prática.
Isso só vem confirmar o quanto o formador pode aprender observando a atuação dos participantes do grupo, principalmente quando estão no papel de coordenadores.
Rosa Maria Antunes de Barros

O curto espaço de tempo é uma reclamação constante nas avaliações dos Encontros que temos realizado. Nem os grupos mais comprometidos com a pontualidade nos horários consideram satisfatório o tempo destinado aos trabalhos nos grupos. De minha parte, no entanto, sinto que andei me perdendo no tempo, em certos locais. Acabei, por conta disso, contribuindo para que as atividades de simulação fossem bastante corridas, sem o devido preparo. Ao assistir à Aricélia coordenando um grupo em Cuiabá, percebi que eu não venho dando tanta ênfase ao tempo das atividades no contrato didático. E que talvez seja essa ação tão simples que eu tenha de reforçar.
Alice de La Rocque Romeiro

13 A dimensão Pedagógica do Programa Parâmetros em Ação" (de circulação interna da SEF/MEC, no âmbito da Rede Nacional de Formadores).
Fonte: MEC. Ministério da Educação. Programa de Formação de Professores Alfabetizadores - PROFA. Guia de Orientações Metodológicas Gerais. 2001. p. 37-47.

16 de fevereiro de 2009

Conteúdos e metodologias de formação



Além da explicitação de pressupostos gerais e da definição de objetivos para as ações de formação inicial e continuada, um modelo de formação de professores – comprometido com o desenvolvimento de competências profissionais – terá de fazer opções em relação aos conteúdos que compõem o conhecimento profissional e a metodologias (formas de tratar os conteúdos) que tornem possível as intenções estabelecidas.
Em qualquer campo de atua ção, o conhecimento profissional representa o conjunto de saberes que habilita o indivíduo para o exercício da profissão – no caso do professor, é o conjunto de saberes que o habilita para o exercício do magistério, que o torna capaz de desempenhar todas as suas funções profissionais.
O conhecimento profissional do professor deve construir-se, fundamentalmente, no curso de formação inicial, ampliando-se, depois, nas ações de formação em serviço das quais participa. Conforme indica o Referencial de Formação de Professores, os âmbitos de conhecimento profissional do professor são os seguintes: 9

• Conhecimento sobre crianças, jovens e adultos.

• Conhecimento sobre a dimensão cultural, social e política da educação.

• Cultura geral e profissional.

•Conhecimento pedagógico. 10

• Conhecimento experiencial contextualizado em situações educacionais.

O tratamento a ser dado aos conteúdos que integram cada um desses âmbitos pressupõe metodologias de formação que privilegiem a construção e o uso de conhecimentos, ao invés de apenas a transmissão de informações teóricas. Essa opção pressupõe considerar o professor um sujeito ativo de seu processo de formação e enfatizar o trabalho com situações-problema que demandem a utilização de saberes adquiridos – pressupõe,portanto,um outro "lugar" para os conhecimentos teóricos, um outro tipo de relação teoria-prática, diferente do que orienta os modelos tradicionais de formação. Se o professor é o centro desse processo específico de ensino e aprendizagem que é a formação profissional, se a construção das competências definidascomo objetivos gerais passa necessariamente por saber pôr em uso o conhecimento disponível e saber buscar o conhecimento necessário para responder aos desafios colocados pelo exercício da profissão, não seria um modelo de ensino homogeneizador, enciclopédico, exclusivamente teórico e centrado na transmissão de informação que tornaria possível as aprendizagens que se pretende garantir.


Professor: sujeito do processo de formação

Todo indivíduo inicia suas aprendizagens com um repertório de conhecimentos prévios e de representações que interferem no modo como se relaciona com as novas informações.11 A aprendizagem do novo é sempre resultado de um processo de revisão, modificação e complexificação desses conhecimentos prévios e dessas representações (Zabala, 1998). Nesse processo, interferem alguns fatores importantes como a "distância" entre o já sabido e o que se aprende, as características das novas informações e a disponibilidade para a aprendizagem (o que depende, em grande medida, da confiança do aprendiz na própria capacidade). A aprendizagem será mais significativa ou mais superficial, dependendo das reais possibilidades do indivíduo estabelecer relações entre o que está aprendendo e o que já sabia anteriormente.
Se entendemos que a formação profissional é um processo de ensino e aprendizagem, que aprender exige uma elaboração pessoal, que essas elaborações são marcadas pelas experiências anteriores de quem aprende – pois determinam o repertório de conhecimentos com o qual o indivíduo se aproxima das novas informações, organiza-as e estabelece relações entre elas –, não há outra alternativa a não ser tratar o professor em forma ção como sujeito ativo e singular.
Se acreditamos que a experiência de vida, a experiência escolar do professor como aluno e as possíveis experiências profissionais anteriores marcam suas representa ções pessoais, concepções e crenças – sobre a educação, a instituição escolar, as problemáticas sociais que se manifestam na escola, as relações educativas, os alunos, os conteúdos de ensino, as formas de ensinar e aprender – e tudo que compõe o repertório pessoal com o qual ele lida o tempo todo nas situaçõescotidianas, não há outra alternativa a não ser tratar o professor em formação como sujeito ativo e singular.
Não se trata simplesmente de uma atitude de respeito pessoal e intelectual, mas de uma escolha metodológica coerente: não se pode conceber um processo de ensino e aprendizagem de professores em que eles não sejam os protagonistas. As diferenças no percurso de construção das competências profissionais devem ser consideradas e respeitadas – mesmo compartilhando experiências semelhantes, cada pessoa reage segundo suas caracter ísticas de personalidade, seus recursos intelectuais e afetivos e seu estilo de aprendizagem.
Se existem competências básicas imprescindíveis a conquistar, existem também, do ponto de vista de cada professor em formação, caminhos e distâncias diferentes para alcançá-las. Assim, as diferenças de percurso precisam ser consideradas e respeitadas: mesmo compartilhando experiências semelhantes, cada pessoa interagecom elas segundo suas características de personalidade, seus recursos intelectuais e afetivos e seu estilo de aprendizagem.
Considerar os futuros professores como sujeitos ativos de seu processo de construção de conhecimento implica considerar suas representações, conhecimentos e pontos de vista; criar situaçõesproblema que os confrontem com obstáculos e exijam sua superação; criar situações didáticas nas quais possam refletir, experimentar e ousar agir a partir dos conhecimentos que possuem; incentivá-los a registrar suas reflexões por escrito; ajudá-los a assumir a responsabilidade pela própria formação.
A natureza educativa da atua ção profissional de professor exige-lhe um grande envolvimento pessoal e uma capacidade de analisar como se engaja pessoalmente no trabalho, que tipo de relações interpessoais estabelece, como as suas expectativas podem interferir nas expectativas e condutas das pessoas com quem convive no trabalho (especialmente os alunos), como pode regular sua própria conduta, segundo os efeitos que consegue perceber. Aos formadores – educadores também –cabe criar condições para esse tipo de aprendizagem.

Aprendizagem do professor: um processo singular, fruto de construção pessoal e coletiva

Para que a formação de professores possa constituir-se em umprocesso de desenvolvimento pessoal e profissional de fato, é imprescindível considerar os processos pelos quais eles se apropriam do conhecimento, as suas características pessoais e o seu conhecimento experiencial e profissional.
Se, por um lado, a aprendizagem é um processo pessoal e singular, por outro é fruto de construções também coletivas:muitos conhecimentos resultam de aprendizagens conquistadas coletivamente. O trabalho em colaboração é um poderoso aliado nesse sentido, e muitas evidências têm mostrado que, em situações de real parceria, se conquista um nível superior de conhecimento ao que se poderia conquistar sozinho.
Por ser a aprendizagem uma construção pessoal, jamais será possível que todas as pessoas desenvolvam igualmente, no mesmo nível e no mesmo ritmo, todas as competências necessárias à atuação profissional.
A construção da maioria delas requer trabalho coletivo dos professores e também dos formadores – dificilmente se poderá promover a real colaboração entre os futuros professores, se os formadores não a tomarem como um princípio orientador da própria atuação.
O trabalho coletivo e a aprendizagem em colaboração são recursos valiosos, pois permitem que professores e formadores aprendam uns com os outros, o que potencializa mutuamente a ação de todos para responder aos desafios relacionados à atuação profissional de cada um. Provavelmente, nenhum formador terá como atender a todas as demandas dos professores e, portanto, a construção coletiva de respostas é, por assim dizer, inevitável.
Cabe às instituições formadoras (Secretarias de Educação, escolas,universidades...) a responsabilidade pela criação de uma cultura detrabalho em colaboração, promovendo atividades constantes de interação, comunicação e cooperação entre os professores e deles com os formadores – seja em situações de pesquisa, de elaboração de trabalhos escritos, de análise de práticas, de debate sobre questões sociais, seja por meio de outros intercâmbios que façam sentido nas práticas de formação profissional.



Resolução de situações-problema

A resolução de situações-problema implica, em maior ou menor grau, uma série de procedimentos complexos: a análise da situação, a identificação dos aspectos mais relevantes, a interpretação de índices contextuais, a busca de recursos de solução, a aplicação de conhecimentos, o levantamento de hipóteses quanto às possibilidades de encontrar uma boa resposta, a "transferência" e o ajuste de estratégias utilizadas em outras situações e pertinentes ao problema em questão, a tomada de decisão quanto ao melhor encaminhamento, entre vários possíveis.
Assim descritos, teoricamente, os procedimentos relacionados à resolu ção de problemas podem parecer de fácil tratamento. E, na verdade, não é tão difícil abordá-los. Entretanto, os problemas a serem resolvidos pelo professor no seu cotidiano profissional não são todos previsíveis e, mesmo quando o são, não é possível controlar previamente todas as variáveis intervenientes. Além do que, quase sempre exigem respostas imediatas que não permitem dissecá-lo em partes para poder compreendê-lo completamente e depois resolvê-lo. A atuação do professor é situacional.Não faz sentido, portanto, um tipo de formação profissional que não coloque o professor, tanto quanto possível, em situações similares às que enfrenta/terá de enfrentar na prática.
Quando a formação profissional privilegia a resolução de situações-problema, são recursos valiosos as situações de tematização de atividades documentadas em vídeo, de simulação e de estudo de caso: por meio dessas situações, pode-se levar os professores a experimentar o lugar de quem precisa tomar decisões, o que exige a utilização dos saberes necessários para tanto. Dessa forma, é possível criar condições para que eles não só mobilizem conhecimentos teóricos que contribuem para a análise das situações em questão, mas construam novos conhecimentos a partir delas.

Reflexão sobre a prática

A reflexão sobre a prática é a "marca registrada" de um modelo de formação profissional que se pretende problematizadora. A velha máxima ação-reflexão-ação é o que há de mais representativo de uma metodologia centrada na reflexão sobre a prática e na aquisição de conhecimentos que contribuam para imprimir cada vez mais qualidade à atuação do professor. A articulação teoria-prática e a resolução de situações-problema são opções metodológicas que estão na base de um modelo assim.
Refletir é um tipo de fazer, é uma forma de proceder, pois a reflexão é um procedimento. Questionamento, análise, interpretação, construção de hipóteses, comparação, inferência, estabelecimento de relações são procedimentos também, embora nem sempre observáveis. O momento de maior ação mental de um indivíduo – aquele em que ele está solucionando um problema de grande complexidade,por exemplo – pode ser o momento em que está em silêncio absoluto, sem sequer se mover.
Os procedimentos são conteúdos da maior importância, tanto na educação básica como na formação profissional dos professores. Isso significa que devem ser objeto de ensino. Não se pode esperar que um indivíduo saiba fazer algo quando não se criaram condições para que aprendesse. Questionar, analisar, interpretar, construir hipóteses, comparar, inferir, estabelecer relações, resolver problemas – assim como planejar, avaliar, registrar a prática, trabalhar coletivamente – são procedimentos fundamentais na prática pedagógica e, portanto, devem ser conteúdo da formação dos professores.
A construção das competências que são objetivos gerais da formação depende de que os professores desenvolvam esses e muitos outros procedimentos relacionados aos diferentes âmbitos de conhecimento. Um professor é tanto mais competente quanto mais souber encontrarrespostas para os desafios colocados pela prática, ou seja, quanto maior for sua capacidade de resolução de situações-problema.
A resolução de situações-problema, enquanto dispositivo metodológico da formação, é um meio de o professor aprender a pôr em uso o que sabe e pensa, para encontrar respostas adequadas. É um espaço de aplicação de conhecimentos – inclusive procedimentos – e de exercitação de condutas que o cotidiano profissional lhe exigirá.
As competências se constituem em processos ativos de reflexão sobre situações concretas e contextualizadas: são construídas a partir do uso de conhecimentos "sobre", mas também de conhecimentos mobilizados ou construídos "na" experiência. As competências exigem um saber fazer que só se pode aprender fazendo. A reflexão sobre a prática é o que possibilita, a professores e formadores, o desenvolvimento da capacidade de simultaneamente fazer/pensar sobre o fazer.
O contexto educativo, como qualquer outro, não é uma totalidade estável. Intervir nesse contexto demanda a construção de saberes que possam servir como instrumento de análise das situações cotidianas da escola e da própria implicação pessoal na tarefa de educar.
A atuação profissional do professor requer um certo nível de improvisação.Não aquele tipo de intervenção desprovida de objetivos reestabelecidos, de um projeto, de um eixo norteador, mas um tipo de ação movida por decisões tomadas situacionalmente. Essa circunstância exige formulação pessoal de estratégias de ação, uso de saberes disponíveis e construção de novos conhecimentos a partir de práticas pedagógicas analisadas contextualmente.
É fundamental que o professor aprenda a interpretar a realidade, ou seja, compreender o que há "por trás" das aparências, as múltiplas dimensões e relações envolvidas nas situações com que se depara no cotidiano profissional. Esse conhecimento não se constrói apenas com estudos sobre a realidade. Demanda uma interação significativa com ela, a partir da qual seja possível criar formas de intervenção realmente eficientes e/ou transformadoras. Demanda investigação. O processo de investigação, no que se refere à atuação profissional de professor, é de outro tipo, diferente do que tem lugar na pesquisa acadêmica. Configura-se numa atitude cotidiana de busca de compreensão da realidade educativa e da própria prática, e em procedimentos de análise contextual, de análise da experiência vivida, de identificação de problemas, de formulação de hipóteses, de problematização das próprias hipóteses e de elaboração de respostas – e, especialmente, de interpretação do que dizem e fazem os alunos.
Aprender a investigar a prática profissional, pela reflexão em parceria com outras pessoas, é condição para o professor conquistar a competência de tomá-la, autonomamente, como objeto de análise.
A reflexão compartilhada sobre a prática, utilizada como instrumento metodológico, é uma forma de ajudar o professor a refletir sobre práticas em geral – a sua, inclusive – para poder aprender a refletir, por si mesmo e cada vez mais, sobre a sua própria.
Pela natureza da atuação pedagógica – núcleo da atuação do professor – cabe a ele considerar, o tempo todo, os objetivos educativos a que se propõe, as circunstâncias contextuais e as possibilidades reais de aprendizagem de seus alunos. É principalmente por isso que pode ser o ator principal da produção de conhecimento pedagógico – quando investiga, reflete, seleciona, planeja, organiza, integra, avalia, articula experiências, recria e cria formas de intervenção junto aos alunos, analisa seu percurso de aprendizagem, regula as próprias ações em função dos efeitos que verifica, o professor está produzindo conhecimento e desenvolvendo sua autonomia profissional.
A possibilidade de o professor refletir sobre seu trabalho e elaborar propostas que promovam de fato a aprendizagem dos alunos, depende, em grande parte, dos conhecimentos teóricos que possui. Estes, aliados à experiência pessoal, permitem que construa novas possibilidades de olhar criticamente para o que faz. Só assim se poderá superar uma tradição na cultura escolar: a reprodução irrefletida de práticas consideradas adequadas pelos outros.
Tematizar a prática é algo que requer a mobilização de diferentes tipos de saberes que permitam enxergar – o mais possível – o que ela revela, compreender as concepções subjacentes, aprender a partir da observação, encontrar encaminhamentos alternativos aos propostos na situação analisada. Isso se pode fazer a partir da observação direta em estágios, ou a partir de situações simuladas, relatos orais e escritos, produções de alunos, atividades registradas em textos ou vídeos e estudos de caso.
Os recursos tecnológicos são aliados importantes na formação de professores: podem ampliar as possibilidades de tematização da prática, pois dispõem de formas privilegiadas de registro. Um vídeo, por exemplo, pode "captar" aspectos da intervenção do professor e da tomada de decisão em situações contextualizadas, o que enriquece a reflexão sobre as práticas de ensino – tanto em situações exemplares,12 cuja finalidade é servir de modelo de referência para os professores, como em situações com resultados insatisfatórios, ou que "não deram certo", que permitem uma análise crítica das razões do insucesso da proposta. Qualquer fragmento de situação didática, quando documentada em vídeo, serve para tornar a prática objeto de reflexão: para isso é necessário que se desenvolva a capacidade de interpretar o que ela revela e se tenha disposição de empreender o esforço necessário para tanto – pois não se trata de um procedimento fácil.
Embora seja mais comum considerar objeto de análise a atuação pedagógica, todas as dimensões da atuação profissional podem ser tematizadas em um processo de reflexão compartilhada e/ou pessoal.



Avaliação: um recurso em favor da aprendizagem dos professores

Quando a perspectiva é que o processo de formação garanta o desenvolvimento de competências profissionais, a avaliação dos professores assume um papel fundamental, pois é o recurso mais importante para aferir as conquistas, as potencialidades, os obstáculos, as limitações e as dificuldades. Nessa perspectiva, a avaliação destina-se à análise da aprendizagem dos professores, de modo a favorecer seu percurso e regular as ações de formação, considerando as competências profissionais que são objetivo da formação: é, portanto, parte integrante da metodologia de formação. Em um modelo de formação que toma o professor como sujeito do processo de ensino e aprendizagem e a resolução de situações-problema como um recurso metodológico privilegiado, a avaliação é sempre diagnóstica e, como tal, o ponto de apoio para o planejamento da ação.
Para que se possa atender às necessidades de aprendizagem dos professores e planejar situações formativas desafiadoras,é preciso saber quais são seus conhecimentos prévios sobre os principais conteúdos a abordar, o que pressupõe identificar o que sabem ou não a respeito.
Não há como responder a necessidades de aprendizagem e propor desafios quando se desconhece os saberes reais de quem aprende.
Para aferir a qualidade das aprendizagens dos professores e das situações de formação propostas – ou seja, do processo de ensino e aprendizagem que tem lugar no contexto de formação – é preciso avaliar a eficácia das ações desenvolvidas, diante dos objetivos dos quais decorrem.
Para oferecer aos professores devolutivas sobre as suas aprendizagens, ajudando-os a monitorar o seu percurso de formação em relação às expectativas previamente estabelecidas, é preciso avaliar o que estão ou não aprendendo, os avanços, as eventuais distorções, as incompreensões, as maiores dificuldades. Portanto, do ponto de vista metodológico, avaliar é parte do processo de formação, num modelo em que a aprendizagem dos professores é a meta principal. As situações de avaliação é que tornam possível diagnosticar questões relevantes, aferir os resultados alcançados, considerando os objetivos propostos, e identificar mudanças de percurso eventualmente necessárias.
A construção da competência de avaliar depende da clareza quanto a concepções, finalidades, instrumentos, modalidades e propostas adequadas de avaliação, mas depende de certas capacidades cujo desenvolvimento é necessário: identificar dados relevantes, generalizar, estabelecer relações, procurar razões implícitas, interpretar índices contextuais.
Saber como os professores aprendem, quais as estratégias metodológicas mais apropriadas para tratar os diferentes conteúdos, quais os melhores instrumentos para verificar as aprendizagens conquistadas e quais as variáveis que podem interferir na avaliação, faz parte das condições necessárias para os formadores avaliarem adequadamente os professores.
Aferir a qualidade das propostas desenvolvidas, das aprendizagensconquistadas e dos efeitos das propostas nas aprendizagens é um procedimento difícil, porém central, no processo de formação.
Evidentemente, avaliar as aprendizagens dos professores não implica punir os que não alcançam o que se pretendia, mas ajudá-los a identificar melhor as suas necessidades de formação e empreender o esforço necessário para realizar sua parcela de investimento no
próprio desenvolvimento profissional. Dessa forma, o conhecimento dos critérios utilizados e a análise dos resultados e dos instrumentos de avaliação e auto-avaliação, são direitos dos professores, pois favorecem a consciência do próprio processo de aprendizagem, condição para esse investimento.
Tendo a atuação de professor uma natureza complexa, avaliar as competências profissionais no processo de formação, é, da mesma forma, uma tarefa complexa. Embora seja mais difícil avaliar competências profissionais do que conteúdos convencionais, há muitos instrumentos para isso. Algumas possibilidades:
• identificação e análise de situações educativas complexas e/ou problemas em uma dada realidade;

• elaboração de projetos para resolver problemas identificados num contexto observado;

• elaboração de uma rotina de trabalho semanal a partir de indicadores oferecidos pelo formador;

• definição de intervenções adequadas, alternativas às que forem consideradas inadequadas;

• planejamento de situações didáticas consonantes com um modelo teórico estudado;

• reflexão escrita sobre aspectos estudados, discutidos e/ou observados em situação de estágio ou documentada em vídeo;

• participação em atividades de simulação;

• estabelecimento de prioridades de investimento em relação à própria formação.
Em qualquer um desses casos, o que se pretende avaliar não é a quantidade de conhecimentos adquiridos, mas a capacidade de acioná-los e de buscar outros para realizar o que é proposto – uma coisa é ter conhecimentos sobre determinado tema; outra,muito diferente, é saber utilizá-los quando necessário. O que se deve avaliar principalmente é a capacidade de o professor pôr em uso o que sabe para resolver situações similares às que caracterizam o cotidiano profissional na escola: os instrumentos de avaliação só cumprem sua finalidade se puderem diagnosticar o uso funcional e contextualizado dos saberes conquistados pelo professor. E, nesse sentido, o que se coloca na formação dos professores é o mesmo que se defende para o processo de ensino e aprendizagem dos alunos.


8 As questões tratadas neste item são abordadas também nos Referenciais para a Formação de Professores.
9 Para mais informações sobre os conteúdos que integram cada âmbito de conhecimento, ver Referenciais para a Formação de Professores, p. 87.

10 O âmbito de conhecimento pedagógico desdobra-se nos seguintes temas: Currículo e Desenvolvimento Curricular, Questões de Natureza 11 Didática,Avaliação, Interação Grupal, Relação Professor-Aluno, Conteúdos de Ensino e Procedimentos de Produção de Conhecimento Pedagógico.Piaget já dizia que não é possível aprender algo que seja absolutamente novo, ou seja, algo que não possa ser relacionado a nenhuma idéia anterior.

12 É o caso de muitos programas da TV Escola, destinados a socializar práticas de boa qualidade, bem como dos que integram o Programa de Formação de Professores Alfabetizadores.
Fonte: MEC. Ministério da Educação. Programa de Formação de Professores Alfabetizadores - PROFA. Guia de Orientações Metodológicas Gerais. 2001. p. 25-33.